quinta-feira, 9 de março de 2017

Agora é a vez dos homens


Hoje comemora-se um dos 364 dias do Homem. Magro reconhecimento da dificuldade de o ser nos dias de hoje. A deusa não quer saber e o escravo tem vergonha de dizer o que lhe vai na alma em público. Além de que lhe falta tempo. Tem de agradar a todos sem parar. E de assinar as contas, os contratos, os processos judiciais, as notas dos filhos que estudam na Católica (a tal que só reconhece a existência legal do pai). Passa tardes na Zara com um calor do deserto -- o suor a cair-lhe pelo rosto -- a acompanhar a mulher nas compras, ao mesmo tempo que lhe ouve as queixas da Tita, da Kika, da Mimi. Manifesta interesse em ver a biografia de Tolstoi e ela a querer assistir ao jogo do Benfica na Sport TV. E depois a conversa do costume, temos de falar mais vezes do que eu gosto na cama, já não gostas de mim, um dia isto vai acabar mal. As ligas a quererem dar um sinal da sua graça debaixo do robe e a Teodora Cardoso a falar na televisão. O telefone toca, querem vender colchões mas só aceitam falar com o homem da casa. O corpo a pedir cama que o dia de amanhã é extenuante. Aturar o chefe, penetrar a intimidade que as pernas da colega Júlia ajudam a encontrar, fazer o cunnilingus à vizinha do 3* esquerdo antes do jantar. À noite assistir ao debate sobre os erros daquelas azémolas dos árbitros do Benfica-Torres Vedras, visitar por volta das três da manhã os aposentos da Lurdes, a empregada da casa que espera furiosa pelo senhor desde a meia-noite e um quarto, acabar de preencher a auto-avaliação que ficou de entregar no departamento de recursos humanos. 
Tem de ser aprovada a sua prestação profissional assim como a sua performance sexual. Que diria a Teresa e a sua amiga Michelle quando amanhã se encontrar com elas e o desempenho resultar em algo que não corresponda aos mínimos olímpicos. Não que as mulheres não são como os homens. Não se calam. Contam tudo. Destroem o prestígio de um macho em dois tempos. São mais discretos os técnicos do departamento de recursos humanos. Malvadas das mulheres. Os homens têm de estar sempre prontos. Quer queiram quer não. Em pé é a posição natural daquele que usa fato e gravata e tem de lutar pela defesa da honra da mulher e dos filhos. 364 são poucos dias.

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