domingo, 16 de abril de 2017

O pecado e a redenção


Era a terceira paróquia daquele dia, em terras do interior, sem gente e a pouca que ali vivia à espera do passamento para a eternidade.

Trinta e três graus no céu e trinta e três botões na sotaina. Quantas saudades de Salamanca e do tempo da Páscoa que lá se vivia. Festejava-se a Ressurreição de Cristo e a chegada à vida adulta das jovens tresmalhadas.

Ao mesmo tempo discutia-se o pecado e a redenção. Era considerado pelos pares um padre promissor. A tentação e o diabo encarregaram-se de o mandar para aquele fim do mundo.

E o calor que não dava tréguas. O calor e as mulheres velhas que queriam o salvo-conduto para o céu.

Ao seu lado uma delas falava e falava cumprindo o sacramento da confissão. Não a ouvia porque diziam todas mais ou menos a mesma coisa. Que a vida era difícil, os filhos fora a fazerem pela vida, o marido enterrado naquela terra de satanás.

O padre resolveu despertar daquela letargia e finalmente perguntou qual a sua contrição. A mulher velha pôs a mão no sacerdote e disse-lhe: “Eu o absolvo dos seus pecados em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo”.
Os trinta e três botões e o cabeção cada vez mais sufocavam o homem de Deus e dos dias de Salamanca, mas mesmo conseguiu responder: “Ámen".

"Vá em paz e reze três Ave Marias e dois Padre Nossos" – sentenciou a velha.

O padre levantou-se resignado, pensou na casa paroquial, nos trinta e três botões de que finalmente se ia livrar e na ceia cozinhada com fé pela santa da Rosalina.

Photo by Cristina Garcia Rodero, 1980

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