Ao
mesmo tempo que nas três últimas décadas os jornalistas e os líderes de opinião
diziam mal da escola e dos professores – ao contrário do que acontecia com o
serviço nacional de saúde –, os jovens portugueses iam mudando a uma velocidade
estonteante. Mais cosmopolitas, mais criativos, mais sabedores. A saberem ler
música e a escreverem bem. A investigarem em laboratórios matérias complexas.
Mesmo com os políticos a fazer asneiras no ensino. E os jornalistas a odiarem
os professores.
Um dia
vai ser preciso fazer a história de tudo isto e dizer os nomes dos iluminados
que tantas idiotices disseram nas mais diversas tribunas mediáticas. Mesmo
sabendo que nem todos os jovens chegaram aonde todos gostaríamos. Nem eles nem
a sociedade em geral. Mas a verdade é que os novos portugueses não diferem dos
outros europeus. É vê-los em qualquer areópago internacional.
É neste
contexto que aparecem jovens como o Salvador Sobral ou a irmã. Altivos, sem
serem arrogantes, simpáticos porque inteligentes, cultos e diferentes. A
falarem inglês e a saberem música. Com noção elevada do bom gosto. A terem
consciência que o simples é o mais difícil. E que a qualidade reside na
imaginação e não no visual feérico.
Salvador
Sobral percebendo tudo isto criou no entanto um boneco. Bem engendrado. Minimalista
mas verdadeiro. A apelar ao sentimento que a música e o poema juntos conseguem na
perfeição. Mexendo com as pessoas. Todas. De qualquer língua. A partir do
português. Essa língua que é um sentir próprio de um povo muito antigo. E
moderno também. Que mistura a saudade do mar e a vontade de descobrir a
ciência. Que continua a escrever poesia como poucos. E passo a passo começa a
perder a vergonha de si mesmo, imposta por tempos de miséria e de ignorância.
Servindo o poder de poucos.
Seria
uma lição se os portugueses vissem a conferência de imprensa para estrangeiros
que se seguiu ao festival. Os nossos políticos não conseguiriam uma prestação
como a do Salvador Sobral. Falou com uma desenvoltura e um sentido de humor que
conquistou todos. Da mesma forma que antes tinha criado um dos momentos mais
altos da história do Eurofestival: a interpretação da canção vencedora ao lado
da irmã que provavelmente os europeus nem sabiam que cantava. Portugal e o Salvador
estão de parabéns. E a União Europeia também.
Francisco Sérgio de Barros
e Barros
(Carteira profissional
de jornalista TE-02)
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