sábado, 26 de junho de 2021

Dupond e Dupont


Ao que este país chegou! Dupond e Dupont a ocuparem os dois mais altos cargos da nação. Marcelo, presidente da república, afiança dias antes de a variante delta se tornar prevalente em Portugal, que com ele não haverá nunca recuo no processo de desconfinamento. Ferro Rodrigues, presidente da assembleia da república, entusiasmado com o empate sobre a França incentiva os portugueses a invadirem este domingo Sevilha para assistirem a mais um jogo da selecção. Isto num momento em que Sevilha é classificada como zona a evitar considerando os índices de transmissibilidade da covid que ali se fazem sentir. Mais tarde, avisado da asneira em que se meteu, o número dois do regime diz que quem tratou de tudo foi o número um, que ele é que sabe de todas as coisas. 
E o país a ser governado por tontos desta espécie. 

Foto: maisfutebol 

terça-feira, 8 de junho de 2021

O dedo em riste


— Vamos lá esclarecer uma coisa: se vens para o Paraíso, lugar de eleição criado por Deus, limar as unhas, a porta de saída é já ali. O caminho que deverás então  percorrer fica em frente. Quando encontrares uma avenida pejada de suvs da Porsche e da Mercedes e prédios com arremedos de varandas, terás chegado finalmente ao teu destino.

terça-feira, 1 de junho de 2021

Eu Criança


A criança que está nessa fotografia não é uma criança. Nunca o foi. Rosto metido entras as páginas de um livro, circunspecto com os demais, interessado em matérias de que ninguém queria saber. 
É este o meu retrato enquanto menino que tinha idade de o ser. Obviamente que, tendo em conta a estranha metáfora em que me havia transformado, não gostava de mim. Hoje penso que invejava os outros ao mesmo tempo que alguns deles me invejavam também.
Ainda agora sofro as consequências de não ter sido criança quando devia. Por alguma razão abomino a normalidade, a monotonia das coisas. 
A forma que naquele tempo encontrei de dar a volta a tudo isto foi a de servir-me da única vantagem que um indivíduo diferente entre iguais pode ter: o de dizer às raparigas que sabia tudo acerca delas. E a verdade é que sabia. 
Mas essa estratégia só a descobri aos quinze anos de idade. 
De então para cá não fiz outra coisa senão fugir de ser aquele miúdo ensimesmado. É por isso que tenho percorrido durante toda a vida as noites quentes de mar e festa. Mesmo que sentado em frente ao televisor no sofá da sala.
Ainda hoje custa muito ser o menino do retrato.  

Dia da Criança, 1 de Junho de 2021