domingo, 17 de dezembro de 2017

O cargo de Presidente da República

 

Não, assim não. O cargo de Presidente da República tem como principal função a de ser garante da unidade de um povo. Para isso, precisa de estabelecer harmonia entre os três poderes políticos de um País: o executivo, o legislativo e o judicial. A não ser assim, nunca a nação se poderá reconhecer num Estado. Quer dizer, se um presidente estiver, em termos abstratos, ao lado de um povo contra as funções administrativas, políticas e judiciais que organizam um país, ou está a reunir em si todos os poderes exercendo um caudilhismo de consequências imprevisíveis ou, em termos igualmente hipotéticos, conduz os homens e mulheres reais em direção a uma utopia (neste caso de carácter pessoal), a que se chama normalmente de revolução.
Ora, num e noutro caso, ultrapassando em muito os seus deveres. É esta a razão por que não deve haver mistura de funções. O presidente tem o poder da palavra, o governo o de fazer. Claro que dizer e fazer têm natureza distintas. A prática tem mostrado que misturá-las não é um ato inteligente.
Prometer um número determinado de casas reconstruídas e prazos para entrega aos proprietários quando não se tem o poder executivo é no mínimo demagógico. Muito mais quando animadas estas promessas por itinerários repetidos de compaixão filmadas pelas televisões, ou por selfies fotografadas pelos homens e mulheres que viram arder os seus haveres, no caso dos incêndios deste Verão.
É então que aparecem os beijos e beijos, o abraço ao velho que chora dentro do seu papa-reformas. E também os convites da presidente da Associação de Vítimas do Incêndio de Pedrógão Grande, para as diversas cerimónias e para o Natal que está chegar. “Só convidamos os que nos ajudaram”, diz Nádia Piazza, a fogosa dirigente que ainda vai fazer apaixonar muitos políticos neste país (quem o diz é Jorge Amado nos seus livros, mesmo sem ter tido o privilégio de a conhecer).
Para já, será homenageada com o prémio Cidadania 2017, entregue esta quinta-feira pelo Presidente da República. Depois vai fazer política nos discursos que se vão seguir. 
Não que alguma coisa seja criticável nisto. Existe natural revolta e vontade de fazer o luto que a intimidade de cada um exige. O problema é que já vimos esta cena demasiadas vezes. Muito recentemente até. Alguns partidos e aspirantes a cargos públicos a aproximarem-se e as figuras em ascensão a perderem a cabeça.
Entretanto o governo – todo ele - promove uma das operações mais rápidas e mais difíceis tendo em conta a complexidade que a mesma envolve, construindo casas e promovendo a recuperação económica das indústrias devoradas pelos fogos.
Enquanto isso, a associação da Nádia apresenta ao povo uma pintura acabadinha de fazer, a qual reproduz um presépio no qual participa o Presidente da República vestido de verde e vermelho – qual pastorinho a adorar o deus-menino, e a oferecer uma casa em nome dos portugueses. Iríamos jurar que ao lado está retratada a presidente da associação das vítimas.
E o António Costa? Não foi convidado nem para figurar no quadro nem para estar presente no Natal. Ele que ande pelos corredores de Bruxelas a pedir dinheiro e mande os seus ministros fazer os projetos de reconstrução daquelas zonas e, no fim, diga ao supremo magistrado da nação para ir entregar as casas pintadinhas. Moços, toquem o hino que os foguetes já estouram no ar.

(Foto: Expresso)

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