domingo, 22 de maio de 2022

Reencontro de amigos


Reunir, ao fim de quase quarenta anos, amigos que o foram durante a adolescência, é tarefa quase impossível. Há, no entanto, uma razão que pode eventualmente contrariar este vaticínio, e ela é a geografia dos lugares vividos. 

 

De facto, os rapazes e as raparigas que se vão juntando na fase inicial da vida em razão da vizinhança têm mais possibilidade de conservarem esse sentimento de proximidade. Eles não dançaram ou conversaram apenas juntos — eles viveram também quase em comunhão de cama e mesa.  

 

Principalmente quando há casas que sirvam de poiso comum. É o caso do grupo de amigos que se juntou por estes dias em convívio e que normalmente fazia da residência dos Painhas, nas Ursulinas, em Viana, a segunda casa de todos. 

 

A primeira vez que este almoço-festa aconteceu foi em Dezembro de 2019; logo de seguida surgiu a pandemia, e só agora foi possível reatar (com a ausência de alguns, mais uma vez por motivo da covid!) aquilo que se pretende tornar-se tradição.  

 

Mas atenção: saibam os leitores deste arremedo de reportagem que nem tudo é fácil neste revisitar de pessoas que pareciam perdidos na bruma dos tempos. A começar pelo reconhecimento facial de uns e outros, prosseguindo na inconfessada vistoria do volume das barrigas masculinas — exercício tétrico de resultados dramáticos — além dos efeitos conseguidos pelos cuidados estético-faciais e genéticos de todos.  

 

Mas pior do que isso, muito pior mesmo, é a constatação da razão dos velhos de outrora que nos avisavam de algo que nos recusávamos a aceitar, mas que a dolorosa sentença de que o tempo se foi, expressa no olhar cruzado de todos os que estavam na festa, confirmou de modo inapelável. Com uma velocidade supersónica a vida passou, havendo agora pouco a fazer para a mudar, para trocar de estrada, de profissão, de filhos, de sobrinhos, de noites, de recuperar as férias com que sempre se sonhou e nunca as tivemos, de substituir o nosso alfaiate por outro com mais mestria. 

 

E se por acaso o leitor pensa que não há lugar para sentimentos negativos numa festa como esta, fique a saber que a partir de uma certa altura da tarde o estado de espírito vai sempre piorar.

 

O momento clássico nestas coisas é quando damos conta daquilo que não fizemos e os outros fizeram da vida. Se alguma vez sonhamos em mandar um soco num idiota encartado que nos cansou tantas vezes, e nunca isso aconteceu, logo constatamos, entre os amigos da festa, que há quem parta o nariz dos outros e ainda por cima ganhe muito dinheiro com isso, dirigindo com destreza as rinoplastias cirúrgicas.  

 

Ou então, aqueloutra conviva que foi administradora da televisão pública, o tal meio de comunicação fadado para a carreira profissional do autor destas linhas, desde que a partir dos catorze ou quinze anos andou nos estúdios da RTP a acompanhar o seu pai, sem que dessa contiguidade com a magia televisiva tenha resultado coisa alguma.

 

A somar à … óh! agora não é possível contar-vos mais, porque a miúda mais gira da festa, por quem anseio há décadas, acaba de me vir buscar para dançar…

 

Até um dia destes!  

  

Sem comentários: