sexta-feira, 20 de janeiro de 2023

À minha mãe e ao meu irmão


Hoje a minha mãe e o meu irmão fazem anos. Dantes era dia de festa esperado na minha casa. Agora nada disto parece ter mais razão de ser. A alegria abandonou-nos, os anos de cada um transformaram-se em motivo de lembrança de um tempo irrecuperável.

A minha mãe e o meu irmão estão vivos e com saúde. Mas em tudo o resto, as coisas não são mais as mesmas. Eu parti de Viana há vinte anos num exílio forçado e ainda não resolvido. 

Vivo longe, numa terra onde a incompreensão das diferenças 
entre o forasteiro e a população do sítio é recíproca – eu não os percebo e eles também não me reconhecem como igual.

Dos meus quatro filhos, dois já partiram para a segunda etapa das suas viagens, iniciadas nas cidades grandes para onde foram estudar. A Leonor, a terceira, vai em Setembro. A Vodka, a gata, é a única que continua sem mudar de sítio e sem perceber nada disto.

Mas a solidão dos sítios e das gentes atingiu no ano passado o grito maior de dor de que me lembro, no dia em que o meu pai morreu. Ele era o alicerce do nosso aconchego familiar. A casa de todos parece hoje não ser de ninguém. Mesmo os quadros ou os livros deixaram de ser os mesmos agora que ninguém os explica com a mesma graça e o mesmo prazer no olhar.

É claro que conheço as palavras que normalmente se dizem nestas circunstâncias: “Chegou a altura de seres tu a tomar conta das novas vidas e das novas histórias de que há muito és responsável e não percebeste isso ainda”. 

Está tudo certo. Na teoria, pelo menos. O pior é o vazio que nos acompanha visitemos nós o Pólo Norte ou a Associação de Jornalistas e Homens de Letras na cidade do Porto.

E depois, no meu caso, é a falta do cenário da maior parte das histórias que me marcaram para sempre: a cidade de Viana. Não que aquelas ruas e cafés mereçam tanta saudade assim. Nem sequer as gentes que ali vivem. 

Mas é o meu poiso, o meu berço, o meu colo. É a terra de onde se vem e para onde sempre se vai. Nem que seja de um modo inconsciente. Traduzível apenas a partir da assunção da nossa identidade. 

E depois é a cidade onde vivem a minha mãe e o meu irmão que hoje fazem anos. Com quem vou jantar em pensamento e vontade. No final cantaremos os parabéns a vocês acompanhados do meu pai no seu lugar vazio e das vozes novas dos netos contentes com o futuro que está a começar.

Parabéns Mãe e Rogério.

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