terça-feira, 12 de março de 2019

Fernando Poeta


Já olhei fixamente para a cara deste miúdo e não descobri nada. Pelo menos de diferente. O olhar talvez. Há ali um certo ar interrogativo que pode querer significar inquietude. E alguma tristeza, possivelmente. De resto, quase nada. Com esforço consegue adivinhar-se o auto-convencimento de que consegue dominar o triciclo, de que é orgulhosamente seu e de mais ninguém. E é só isto. Acho que vou desistir: de resto é uma criança igual a tantas outras. Ao que eu fui, por exemplo. Exímio condutor de triciclos. Triste, toda a infância e adolescência triste. Nisto partilho o modo de estar com o rapaz da fotografia. Provavelmente por isso é que me sinto frustrado por não ser capaz de descobrir as sombras e os raios de luz que traçam o perfil do menino ciclista. Logo eu que adivinho o futuro de qualquer pessoa. Como é que se chama o miúdo? Deixa ver: Fernando. Fernando quê? Onde é que está a ficha? Tenho-a aqui: Fernando Pessoa.

Sem comentários: